Por MAGNO HOLANDA
Todos sabemos que cigarro é coisa séria e
que mata milhões de pessoas no mundo inteiro. Cigarro definitivamente não é
coisa de criança, nem de adulto.
... mas preciso desmentir minha própria
fala e dizer que em certo sentido é sim coisa de criança. Pelo menos foi da
minha infância. Cheguei a dar um trago, apenas. Não gostei, mas meu contato com
ele, de alguma forma, era frequente.
... começando minha história, o cigarro
foi marcante porque seu cheiro trazia no meu inconsciente a esperança de um
pai. Parece maluco isso?! Pai sempre foi ausente [muito mais de mim] e nós,
filhos carentes. Então quando percebíamos o cheiro de cigarro, aquilo
significava a sua presença rompendo a madrugada, trazendo consigo maçãs
estragadas e um litro de leite engarrafado.
Também, na magia de criança, achávamos
incríveis seus bilhetes, aos montes, numa mala sobre o guarda-roupa velho do
nosso quarto. Aquelas letras eram incríveis, poéticas, às vezes indecifráveis, sobre um papel branco com
bordas prateadas ou douradas das caixas de cigarro, nesse caso, quase sempre do
PLAZA.
Lembro-me das diversas viagens que fiz,
sob um sol infernal, para a Rua do Sol [O calor de lá justifica bem o nome],
carregando um desses bilhetes, solicitando ao Seu Zé da batata que vendesse uns
quilos fiado.
Ah, as brincadeiras com notas de cigarro
eram incríveis! Subíamos e descíamos Ruas, num jogo de pedras, e quem acertasse
a pedra do outro ganhava uma nota [era como chamávamos as embalagens de
cigarro. Cada uma delas tinha um valor: Hollyood, 1 mil; Belmont, 2 mil; Plaza,
5 mil; continental, 10 mil, e assim por diante.].
Andávamos pelas Ruas ostentando nossas
riquezas com bolos de notas de cigarro, ora ganhos na pedra, ora garimpados nos
lixos da cidade de Campina Grande, na Paraíba. Ora, minha gente, esse é um
conto real e de minha imaginação infantil. É a vivência de pessoas simples,
crianças, moradoras das Ruas campinenses na década de 1990.
As mais importantes notas, tipo Charme e
Malboro, não eram fáceis de encontrar. Parece que só nos melhores lixos. Claro!
Guardávamos segredos do lugar. Diga-se de passagem, a maldade cometida por
Hamilton biscoito, que contava sobre os lixos do Continental, bairro campinense.
Prestávamos muita atenção às histórias contadas por ele. Parece que aquele
lugar era mágico. Ficávamos a imaginar. Ás vezes, queríamos até duvidar, mas
ele nos mostrava muitas notas que nos fascinavam.
Sobre o cigarro, não o associávamos ao mal
ou à doença, ora por nossa inocência ora pelas belas propagandas que sempre
vinculavam o cigarro às belas mulheres, às celebridades, ou à natureza. Mas,
enfim, naquela brincadeira toda, ficávamos ricos em nossa imaginação de criança,
um acalento a nossa pobreza. Esse tipo de imaginação pouco vemos hoje. Não percebemos
mais essa inocência, fantasia, calmaria. Hoje é tudo muito rápido. As crianças
já nascem “adultas”.
PIX: magno.holanda@hotmail.com
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